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Sem cão-guia, Danieli Haloten enfrenta desafios

Danieli Haloten, conhecida por seu papel como Anita na novela Caras e Bocas (2009), vive hoje uma realidade bem diferente daquela dos holofotes da televisão. Primeira atriz cega a atuar em uma novela da Globo, Danieli segue em busca de uma vida independente, mas enfrenta uma dura limitação: está há dois anos sem um cão-guia ativo.
A antiga companheira de Danieli, a labradora Elva, hoje com nove anos, foi aposentada após desenvolver uma hérnia de disco. Desde então, a ex-atriz precisou se readaptar ao uso da bengala, ferramenta que considera menos eficaz no dia a dia. “Faz 25 anos que uso o Cão Guia. Antes, eu andava sozinha de bengala, mas eu era bem mais novinha, então tinha bem mais energia. O Cão Guia na vida prática ajuda muito”, relata.

Danieli ressalta a diferença prática e emocional entre os dois recursos de mobilidade. “A bengala bate no obstáculo. O cão-guia desvia o obstáculo. Ele te ajuda a achar coisas específicas, como saída, portas, elevadores, escadas”, explica. Segundo ela, além de mais autonomia, o cão-guia oferece segurança inigualável: “Eu me sinto muito segura com o cão-guia. Nunca sofri nenhum acidente com ele em 25 anos. Já com a bengala, uma vez quase caí porque a escada estava de um lado e eu virei a bengala para o outro”.
Outro ponto destacado por Danieli é o que chama de “desobediência inteligente”: “Com a bengala, você ouve o trânsito, mas o cão-guia tem a segurança adicional da ‘desobediência inteligente’. Se tiver vindo um carro e você mandar o cachorro atravessar, ele vai desobedecer”.
Atualmente, Danieli aguarda a reposição do animal em três das poucas escolas que oferecem cães-guia no Brasil: o Instituto Federal Catarinense – Campus Camboriú, o Instituto Adimax e o Instituto Hellen Keller. No entanto, a fila é longa e os recursos, escassos. “Quando você está com o cão-guia, você tem toda a independência. Quando você fica sem, é muito difícil. Você volta para o status anterior”, desabafa. “É muito difícil, e é essa a parte mais difícil de tudo. Fico mais limitada, sem a mesma confiança”.
O caso de Danieli não é isolado. Roberto Leite, também usuário de cão-guia, conseguiu seu segundo animal apenas dois meses após entrar na fila do Instituto Adimax, em Curitiba. “Com meu primeiro cão-guia, entre o tempo que fiz o preenchimento do formulário de cadastro e o recebimento do cão, levou um ano e dois meses. Para reposição, quando o meu primeiro cão-guia faleceu em dezembro de 2022, fiz nas três escolas que entregam cães-guia aqui no Brasil”, conta. Ele acrescenta: “O cão-guia, como uma tecnologia assistiva, proporciona mais autonomia e independência”.
O Instituto Adimax confirmou que Danieli está cadastrada, mas que a entrega ainda não foi possível. “A Dani teve contato conosco, mas o processo de entrega não aconteceu ainda porque ela está em uma região onde temos uma base limitada. A região sul é responsável por uma parcela menor no número total de entregas do Instituto Adimax, pois a sede fica em Salto de Pirapora, onde conta com toda estrutura. No Sul, temos apenas um braço”, informou a assessoria. Hoje, mais de mil pessoas aguardam na fila.
A escassez de cães-guia no país está diretamente ligada ao baixo investimento público. Leonardo Goulart Nunes, instrutor do Instituto Federal Catarinense, revela que o orçamento ainda é instável. “O maior desafio continua sendo o orçamento. O MEC ainda não estabeleceu um orçamento definido para o custeio do Programa, então os recursos vêm em parte da Reitoria do IFC e o restante é adquirido via emendas parlamentares ou TEDs do governo”, explica. A média de formação é de apenas 12 cães a cada dois anos.
Além disso, a treinadora Ana Cristine Doerlitz, do Instituto Hellen Keller, ressalta a importância de parcerias e doações para manter o funcionamento da escola. “Hoje, precisamos muito de doação. A gente procura muita parceria com empresas que trabalham no segmento pet, de brinquedos, de shampoo, de coisas assim. Mas também precisamos muito da ajuda individual de pessoas comuns”, afirma.
Ana Cristine reforça ainda que a escassez afeta até as despesas básicas: “Se não tiver essa entrada de verba, eu não consigo pagar os funcionários que trabalham na escola, pagar luz, internet ou remédios e vacinas. São coisas que a gente tem que tirar realmente do bolso”.
Enquanto o cenário não muda, Danieli segue sua rotina com limitações, mas sem abrir mão da esperança de recuperar sua autonomia com um novo cão-guia.
